Ei!, espera aí Isso aqui NÃO é um mangá!

Ei!, espera aí! Isso aqui NÃO é um mangá! Vai começar a ler a nossa estória pelo final? Se você quer lê-la com sentido, clique aqui e vá para o primeiro... "capítulo” (que é do dia 02/04/2014). Depois... é só clicar em "Postagem mais recente" (do lado esquerdo, no rodapé de cada página!) ou... deslizar o dedo (também para a esquerda), como se estivesse virando uma página de um livro!!!).Então!, boa leitura! (e... espero que goste!!!)

sábado, 31 de maio de 2014

Lembranças da infância


A companhia deles enriquecia suas lembranças da infância, e Beatriz sempre lhes seria grata pelo carinho com que a tra­tavam. Mesmo que visse frustrado seu amor por Armando, nunca deixaria de considerá-lo seu melhor amigo.

Engraçado... sempre compartilhara da mesma camaradagem com Mário e Armando, mas o primeiro nunca fizera seu coração bater mais forte. Armando era, de fato, mais bonito, mas Mário não ficava muito atrás. Quanto à personalidade, preferências à parte, era preciso admitir que Mário era muito mais aberto, falante, comunicativo. No entanto, nada disso importava: Armando era seu ideal masculino, e Betty se consideraria a mulher mais feliz do mundo se seu amor fosse correspondido.

Enquanto cavalgava, observou-lhe os ombros largos e musculosos, a cintura fina, as coxas grossas, o porte de cavaleiro nato. Achava-o lindo, sem dúvida, mas não era por esse moti­vo que o amava. Mesmo sem saber ao certo por que gostava tanto de Armando, não desistiria de conquistá-lo até o dia em que ele se casasse com outra garota. E, caso isso um dia realmente acontecesse, o melhor seria internar-se num convento, pois ja­mais amaria um outro homem daquela forma.

A trilha voltou a alargar-se, e os três tornaram a cavalgar la­do a lado. Detendo-se no cume de uma pequena elevação, ad­miraram a paisagem dos tempos de infância. Todos a olhavam com certa nostalgia, recordando-se de épocas passadas, mas Beatriz pensava em dias mais recentes, também.

Fora ali que, dias antes, Armando a beijara pela primeira vez. Ou melhor, que ela o beijara, para provar que já era bem adulta. Será que ele se lembrava? Sinceramente, desejava que não. Po­rém, ao olhá-lo de relance, percebeu que ele a observava e ti­nha um sorriso que falava mais do que mil palavras.

Desviando os olhos, Beatriz olhou para frente, e os três seguiram ao longo do pequeno riacho, ladeado por lindas árvores.

Mário suspirou e comentou:

— Ah!... Graças a Deus tudo continua como antes, do mes­mo jeito que eu guardei na lembrança. É bom saber que, apesar da loucura do mundo, ainda existe um lugar assim. E cá estamos nós, de novo. Talvez bastante modificados, mas ainda assim amigos. Quanto a vocês, não sei, mas isso me faz muito bem.


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sexta-feira, 30 de maio de 2014

Prometo que não vou reclamar.


Enquanto os rapazes bebiam cerveja, Beatriz sempre pre­ferira refrigerantes.

— Pensei em acompanhá-los na cerveja — ela informou.

— Você vai beber cerveja? — Armando perguntou, com um riso incrédulo.

— Não sei por que esse espanto — respondeu, jogando a mo­chila sobre os ombros. — Aprendi a gostar de cerveja. E não se preocupe com o fato de eu beber, pois não sou mais menor de idade.

E, pondo fim à conversa, apanhou a esteira que estava enro­lada sobre uma cadeira e rumou para a porta, sem esperar pe­los companheiros.

Armando tomou-lhe a esteira das mãos e perguntou, desconfiado:

— Para que você está levando esta esteira?

Abrindo a porta, ela sorriu por sobre os ombros:

— O que você acha? Por acaso pensa que vou tentar seduzir nosso colega?

Mário aproximou-se e tirou-lhe a mochila das costas, erguendo-a com facilidade. Então, abraçou Beatriz pela cin­tura e murmurou, num tom que Armando pudesse ouvir:

— Não se preocupe, meu bem. Podemos enrolá-lo na estei­ra e soltá-lo no lago. Aí você vai poder me seduzir à vontade. Prometo que não vou reclamar.

— Quanta generosidade! — Beatriz comentou, rindo, ao se soltar disfarçadamente daquele abraço. — Mas acho melhor não o eliminarmos por completo. Roberto pode ficar triste.

— Podem reclamar à vontade, mas eu não desisto de acompanhá-los. Para ser sincero, fiquei magoado por não ter sido logo convidado.

— Ah... coitadinho! — Beatriz brincou, abraçando-o pela cintura. — Não foi nossa intenção magoá-lo. É que da última vez que o vi você não estava de muito bom humor, pensei que estivesse zangado comigo.

Vê-la desfazer-se de Mário para vir abraçá-lo deixou-o superfeliz e, num gesto súbito de posse, passou-lhe um braço pe­los ombros e puxou-a para junto de si:

— Isso nunca, meu bem. Tomarei conta de você até o dia em que eu morrer.

Beatriz ficou sem palavras. Será que Armando realmente fala­ra a sério? Mas Mário, como sempre, levou tudo na brincadeira:

— Puxa, ia ser um bocado estranho. Isto é, daqui a algum tempo ela vai se casar, e o marido dela pode não gostar da ideia.

— Por acaso está falando em causa própria? — Armando insi­nuou. — Porque, se estiver, já vou avisando que farei o possí­vel para detê-lo.

— Ora, ora, o que há de mal num possível namoro entre eu e Betty? Somos amigos há tantos anos, gostamos um do outro e posso perfeitamente tomar conta dela tão bem quanto vo­cê. Melhor, até. Ela talvez nunca receba uma proposta tão boa quanto a minha.

Chegando à cocheira, Beatriz apanhou a mochila e prendeu-a à sela, sorrindo para Mário:

— É isso que eu mais admiro em você: a modéstia.

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*     *     *     *     *     *     *     *     

Já montados, os três seguiram pelo caminho que conduzia ao pequeno lago da propriedade. A certa altura, onde a trilha se estreitava, Armando tomou a dianteira, como nos velhos tempos, enquanto Beatriz era a segunda, seguida por Mário. Pela primeira vez ela se deu conta de como os dois realmente sem­pre haviam se preocupado em protegê-la. Sempre a trataram com igualdade nas brincadeiras, mas sem nunca se esquecerem de que era uma garota.


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quinta-feira, 29 de maio de 2014

Você se lembra de como prefiro


Beatriz estava de pé, junto ao balcão da cozinha, prepa­rando uns sanduíches para levar à pescaria, quando alguém bateu de leve à porta dos fundos. Em seguida, Mário surgiu, sorridente:

— Posso entrar? Isto é, não vou perturbá-la?

Antes que Beatriz pudesse responder, Mário foi empur­rado e entrou aos tropeções. Logo atrás, veio Armando, com o cha­péu na mão, fazendo o possível para sorrir de modo inocente, como se não tivesse feito nada.

Mário comentou:

— Sinto muito, querida, bem que tentei escapar e vir sozi­nho, mas nosso amigo é esperto e insistiu em vir junto. Sugeri que ele fosse ajudar os rapazes na cocheira, mas Armando não me deu ouvidos. — Então, fingindo-se de desolado, abanou a ca­beça e afirmou, num tom de quem pede desculpa: — É uma pena, confesso que sou um covarde. Ele ameaçou me agredir se eu não o deixasse vir, portanto acabei concordando.

— Mas, como é que você se acovardou, Mário? — ela per­guntou, entrando no espírito da brincadeira.

— Pois veja só, não tive outro jeito. E, agora, o que faze­mos? Devemos deixá-lo vir conosco ou vamos contar tudo pa­ra a sua mãe?

Beatriz olhou de um para o outro e, por fim, suspirou de modo teatral:

— Bem, detestaria ter de entregá-lo a mamãe, portanto va­mos ter de agüentá-lo.

— Está bem, está bem — Armando interrompeu. — Agora que vocês dois já se divertiram bastante, o que acham de irmos embora?

— Preciso de um tempinho para fazer mais uns sanduíches; só fiz o suficiente para dois — Beatriz avisou.

Então, apanhou duas fatias de pão integral e começou a pas­sar manteiga.

— Betty — disse Armando, vacilante —, daria para fazer mais uns dois? É que ainda não comi nada hoje e estou morto de fome.

Achando graça no pedido, ela pegou mais fatias de pão.

— Você ainda não comeu hoje? Não é de se admirar que es­teja com fome. Foi uma pena não ter ficado para o café da ma­nhã comigo e mamãe; os ovos estavam deliciosos, e sobrou bastante. O cozinheiro deve ter achado que precisávamos en­gordar um pouco, ou então planejou juntar-se a nós, mas mu­dou de ideia.

— Ora, não sabia que vocês duas tinham arranjado um co­zinheiro — Mário comentou.

— Não há cozinheiro nenhum; Betty está me provocando.

Armando sorriu ao vê-la espalhar mostarda sobre a carne e disse:

— Pelo visto, você se lembra de como prefiro meu sanduíche.

A Ideia de que ela procurava agradá-lo, o que era de fato ver­dade, deixava-o satisfeito, mas Beatriz não deu o braço a torcer e simplesmente encolheu os ombros:

— É que eu gosto assim e me lembrei de que Mário tam­bém, por isso resolvi caprichar na mostarda. Mas agora que você falou, recordo-me de que você também preferia os seus deste jeito quando saíamos para pescar.

Armando conteve-se para não perder o controle. Sabia que ela es­tava fazendo de tudo para provocá-lo, o que, aliás, tornara-se o esporte favorito de Beatriz nos últimos dias. Caso contrá­rio, por que haveria de fingir que se lembrava das preferências de Mário, quando havia tantos anos que não o via? Só havia uma explicação: estava tentando mostrar que mudaria seu tra­tamento com relação a ele e já não lhe dava a mesma impor­tância de antes.

Pois, se era isso que ela queria, tanto melhor. Tinha certeza de que ocupava um lugar muito mais importante do que o de Mário na vida dela. Era seu protetor, seu guia, seu melhor amigo. Afinal, por que se intrometera naquele passeio se não para defendê-la dos avanços de Mário?

Sem se dar conta de que Armando se remoia, Beatriz continuou preparando o lanche. Depois de preparados os sanduíches, colocou-os na mochila que prenderia à sela do cavalo e acrescentou três maçãs e um pacote de biscoitos de chocolate.

Então, tirou da geladeira uma caixa com seis latas de cerveja e colocou-a sobre o balcão.

— Um de vocês vai ter de carregar isto. Não tenho mais lu­gar na minha mochila.

Antes que Mário se oferecesse, Armando se adiantou:

— Onde estão seus refrigerantes?


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quarta-feira, 28 de maio de 2014

Disse mesmo que está interessada em mim?


Era curioso, mas esse aspecto da questão não o agradava. Afinal, devia estar feliz por saber que sua liberdade não estava mais ameaçada.

— O que você quer dizer com isso? — Roberto perguntou, interrompendo-lhe os devaneios. — Que Beatriz está inte­ressada naquele almofadinha hospedado na casa delas? Pois de­via era dar-lhe um basta. Se quiser, posso conversar com ela.

— Ótima ideia, Roberto Porque, senão, logo, logo ele vai aca­bar comprando a propriedade de Júlia. Quanto a Beatriz, parece não ter notado ainda que tipo de moço ele é. Papai, Betty parece outra pessoa, acredite. Mas, não sei se continua interessada por aquele tal de Mora. Ela agora só fala em Mário: em como ele mudou, como amadureceu, como é educado. Dá para acreditar? Betty acha que eu e ela nos conhecemos bem demais para nos casarmos, mas com Mário é diferente, pois ele esteve fora muito tempo!

— Ela disse isso, é? — Roberto perguntou, coçando o queixo, tentando disfarçar o contentamento.

— Disse — Armando garantiu, num tom ameaçador. — E não ria, porque ela comentou que você também está disponível! Teve até a coragem de dizer que seria minha madrasta! Nunca ouvi nada tão revoltante.

Quando Roberto não podendo mais se conter, deu uma deli­ciosa gargalhada, Armando ficou furioso.

— Ainda bem que você está achando engraçado — disse, in­conformado.

— Engraçadíssimo! — ele garantiu, sem qualquer sinal de constrangimento.

Praguejando, Armando deu-lhe as costas e cruzou a porta da co­zinha. Deteve-se ao deparar com Mário e Inezita sentados à mesa, tomando café, com uma expressão divertidíssima.

— Parece que está virando costume nesta casa as pessoas fi­carem ouvindo conversa alheia.

— Veja lá como fala, Don Armando Mendoza — Inezita o repreen­deu. — Se não quer que ninguém ouça sua conversa, é melhor falar mais baixo. Aposto que até o pessoal das cocheiras escutou a conversa.

Mário sorriu e deu razão à amiga:

— Ela está certa, amigo. Você tende a se exaltar quando...conversa.

Armando lançou-lhe um olhar fulminante, mas não disse nada, limitando-se a apanhar uma caneca no armário. Encostado à pia, encheu-a de café e tomou uns bons goles.

Mário abriu um amplo sorriso e quis saber:

— Beatriz disse mesmo que está interessada em mim? Ela é uma garota maravilhosa e tornou-se uma mulher irresistível.

— Não precisa ficar se gabando — Armando respondeu, num tom ríspido. — Se ouviu a conversa toda, está sabendo que ela tam­bém demonstrou interesse por Roberto — Depois de pousar a ca­neca sobre a pia com toda a força, caminhou até a porta dos fundos e anunciou: — Também vou pescar com vocês dois esta tarde. Portanto, nem pense em sair sem mim!

— Puxa, que mau humor! — Mário comentou com Inezita, assim que Armando saiu.

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terça-feira, 27 de maio de 2014

Incluí-lo nessa brincadeira!


Armando estava furioso quando chegou à fazenda Mendoza. Nunca ficara tão transtornado em toda a vida. E, para piorar, sentia a cabeça latejar desde a noite anterior por ter abusado da bebida durante a festa e, depois, em companhia de Mário.

Logo pela manhã, ao acordar, pensara bastante nos aconte­cimentos da véspera, concluindo que devia um pedido de des­culpas a Beatriz e, embora não gostasse de se desculpar com ninguém, tomara uma boa xícara de café preto e fora até a ca­sa dela. Pena que a encontrasse tão diferente. As atenções mas­culinas que recebia ultimamente vinham afetando-a, transformando-a numa mulher fatal, que afiava as garras para cima de todos os rapazes que a cercavam. Mas enganava-se se achava que podia incluí-lo nessa brincadeira!

Armando estava para entrar na sala quando encontrou-se com Roberto

— Preciso falar com você, meu rapaz — disse o pai, muito sério, com as sobrancelhas grossas franzidas sobre os olhos miúdos.

Era só o que faltava! Armando pensou, inconformado. Corren­do os dedos por entre os cabelos, pendeu o pescoço para trás e suspirou:

— Papai, por favor: agora, não!

— Então, quando o senhor acha que pode ser? — Roberto per­guntou, com ironia. — Na minha opinião, você tirou proveito de uma de nossas convidadas, quando, na verdade, devia tê-la tratado com toda a educação e gentileza. Como teve coragem de faltar ao respeito com uma moça como Beatriz? E ainda mais dentro da sua própria casa!

— Ah, quer dizer que você não se importa que eu a seduza, desde que não seja aqui?

— Você sabe muito bem que não foi isso que eu quis dizer — Roberto explodiu. — Beatriz é uma moça de família, e que­ro que a respeite como tal!

Armando suspirou.

— Ouça, Roberto sinto muito se lhe pareceu que faltei ao res­peito com Betty; não foi essa a minha intenção. Mas o que eu lhe disse ontem à noite é verdade. Foi um acidente. Mas não precisa se preocupar: eu já fui me desculpar.

— Já? E então, como foi? — perguntou, curiosíssimo, com um sorriso significativo.

Armando franziu a testa, diante da expressão do pai.

— Pois pode parar de rir. Sinto desapontá-lo, mas não me saí nada bem. Arrependo-me de ter ido lá.

— Como assim? Ela não o perdoou? Continua zangada?

— Bem, para ser sincero, nem cheguei a pedir desculpas.

— Mas você acabou de dizer que...

— Eu disse que fui me desculpar, e não que pedi desculpas.

— Então, o que foi que você fez? — perguntou Roberto já im­paciente com tantos rodeios.

— Bem, prefiro não tocar nesse assunto. Basta dizer que ela me fez passar por idiota, outra vez.

— Ela o fez de idiota?

— Exatamente. E se pensa que ela está sofrendo, com o co­ração partido, só por que não penso em me casar por enquan­to, engana-se. Há tantos rapazes interessados nela que Betty nem vai sentir a minha falta.

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segunda-feira, 26 de maio de 2014

Ideia absurda


Armando agarrou-lhe o pulso e puxou-lhe o braço para baixo.

— Isso é revoltante e pode apostar que farei de tudo para impedir que leve avante essa ideia absurda. — E, sem mais uma palavra, arrancou o avental da cintura e saiu.

— O que foi? Perdeu a fome? — ela perguntou, fingindo-se de inocente.

O olhar que ele lhe dirigiu por sobre os ombros seria capaz de fulminá-la, mas Beatriz não se deixou abater. Quando a porta da frente bateu, Júlia não pôde conter uma sonora gargalhada.

— Betica, você é mesmo terrível! Estou muito orgulhosa de você, querida!


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Beatriz também se orgulhava de si.


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domingo, 25 de maio de 2014

No mesmo instante em que falava


Apesar de tudo, a cena que presenciou ao chegar à cozinha sensibilizou-a. Júlia estava sentada à mesa, visivelmente abatida, enquanto Armando, com um avental amarrado à cintura, picava um pedaço de presunto sobre a frigideira cheia de ovos mexidos. O cheiro estava delicioso, e Beatriz sentiu o estômago roncar.

Num gesto impulsivo, aproximou-se por trás dele e, abraçando-o pela cintura, apreciou o aspecto apetitoso da comida,

— O cheirinho está ótimo. Espero que você também coma um pouco, pois precisa recuperar as forças.

Furioso, ele se voltou para fitá-la e esquivou-se daquele abraço.

— Agora já chega, Betty. Esta brincadeira pode acabar mal. Pare antes que se arrependa.

— Não seja tão dramático, Armando.

Ele, inconformado, suspirou fundo e virou-se de novo para o fogão.

— Juro que não sei o que houve com você, Betty, nem parece a mesma: seu jeito de falar, suas roupas, seu comportamento, tudo mudou. A quem está tentando impressionar?

— Bem... qualquer um que cruze o meu caminho — respon­deu, de modo casual. — Afinal, a idade vai chegando, e já é hora de eu me casar para construir família.

— Pois não precisa olhar para mim — defendeu-se Armando com a costumeira indelicadeza. — Não estou a fim de me casar tão cedo; ainda tenho muito tempo para me divertir.

No mesmo instante em que falava, Armando imaginou uma cena feliz, com Beatriz sentada numa sala, cercada por duas crian­ças e um bebê no colo. Porém, por mais emocionado que ficas­se, algo dentro de si refutava a ideia.

Havia muitos e muitos anos que Beatriz o considerava a figura masculina mais importante de sua vida, e Armando não gos­taria de perder esse privilégio. Porém, por outro lado, também não gostava das sensações novas que ela vinha lhe despertan­do. Seu desejo, ao vir visitá-la pela manhã, era encontrá-la nu­ma velha calça jeans, camisa de flanela, cabelos presos numa trança, assim como nos velhos tempos.

No entanto, o que aconteceu? Encontrou-a quase nua na ca­ma e, agora, ela continuava mais feminina do que nunca na­quele vestido, acendendo-lhe a chama do desejo. E mais: dera para provocá-lo abertamente, mesmo na presença da mãe.

Arrependido por estar ali na casa dela, maldisse a hora em que saíra da cama!

— Desculpe, Armando, mas lembre-se de que você não é o único rapaz solteiro que conheço — disse Beatriz, ao apanhar os pratos no armário para pôr a mesa. — Há Nicolás, por exemplo. Aliás espero que tenha feito uns ovos para ele, também. Nicolás sempre acorda com fome.

Armando retrucou algo em voz baixa, mas ela fingiu não ouvir.

— E também tem Mário. Ele vem me encontrar esta tarde para irmos pescar. — Então, ocorreu-lhe uma ideia brilhante: — Há Roberto também. Se você não está disposto a aumentar a família, aposto que ele está.

Júlia engasgou com o café, e Beatriz deu-lhe uns tapinhas nas costas. Já a reação de Armando foi mais radical:

— Meu pai?! Você se casaria com meu pai?! Você deve es­tar louca!

Ela deu de ombros:


— Nada disso. Só o mencionei porque ele está disponível, e sei que me acha bonita. Qual o problema, caso venha me tor­nar sua madrasta? — E, aproximando-se, acariciou-lhe o rosto.

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sábado, 24 de maio de 2014

Ela não era mais uma menina


Apesar do choque da mãe, Beatriz achava a situação divertidíssima. Era a primeira vez que conseguia ser alvo das aten­ções de Júlia, que normalmente vivia no mundo da lua, mergulhada no universo fantasioso dos romances que escrevia. Quanto a Armando, jamais o vira passar tanta vergonha.

— Claro que pensou, mamãe. — Continuou com a farsa, bai­xando os olhos. — Afinal, você não é nenhuma garotinha in­gênua; já se casou duas vezes!

— Oh, meu Deus! — Júlia murmurou, deixando-se afundar na poltrona ao lado da cama, fingindo desmaiar.

— Veja o que você fez! — respondeu Armando, indo acudi-la.

— O que eu fiz? — Beatriz indagou. — Não fiz nada. Ainda nem me levantei da cama... Como poderia ter feito alguma coisa?

— Não se faça de boba, sabe muito bem do que estou falan­do. — Passando os braços pelos ombros de Júlia, Armando ajudou-a a erguer-se devagar e apoiou-a contra si. — Venha, Júlia. Vamos tomar uma boa xícara de café forte. Beatriz descerá assim que estiver pronta. Depois, teremos uma conversinha.

— Oh, Armando, você é um amor de menino — Júlia sussur­rou, lançando-lhe um olhar langoroso.

— Ora, mamãe, Armando não é mais criança. Acredite em mim: ele já é adulto, em todos os sentidos.

— Betty, pelo amor de Deus, pare com isso! — ele esbra­vejou. — Não vê que está perturbando sua mãe?

Beatriz deu de ombros, pois sabia que, no íntimo, sua mãe devia estar muito satisfeita com o rumo dos acontecimentos.

— Foi você quem começou tudo isso, Don Armando. Eu estava aqui, dormindo na minha cama; nua, claro, mas com a porta fecha­da quando você entrou e...

— Ora, cale-se! — ele gritou, já saindo do quarto com Júlia, enquanto Beatriz ria entre os lençóis.

Assim que Armando fechou a porta, ela se espreguiçou deliciosa­mente. Era bom vê-lo tão inseguro. Quando criança, sempre o tivera como modelo de perfeição e sabedoria, pois parecia sem­pre seguro de si. Mas, ali, aquela falsa fachada de segurança caíra por terra. Descobrir que ela não era mais uma menina o abalara terrivelmente.

Já que entrara naquele jogo, ia usar de todas as armas para fazê-lo ver e entender que já era uma mulher madura. Estar apaixonada por ele não significava que teria de rolar noites e noites insone na cama; o melhor seria tirar proveito da situação e, com o tempo, Armando acabaria se apaixonando.

Satisfeita, tomou um bom banho de chuveiro e colocou um vestido de algodão florido que comprara em Cartagena. Para com­binar, um par de sandálias de couro, sem salto. Depois de pen­tear os cabelos, passou um pouco de blush e um batom bem claro.


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sexta-feira, 23 de maio de 2014

Confiar em mim até um certo ponto


O rosto de Armando ficou em brasa; nunca a ouvira falar daque­le jeito!

— Não me provoque, Betty, você pode confiar em mim até um certo ponto. E lembre-se de que eu bati à porta, mas não obtive resposta. Suponha que, em vez de mim, fosse aque­le almofadinha que vocês estão hospedando aqui. Já pensou?

Beatriz não conseguia controlar o riso. O jeito de Armando era cômico.

— Em primeiro lugar, Nicolás é muito educado e não entra­ria sem bater no quarto de uma mulher e, caso isso aconteces­se, tenho certeza de que ele teria o bom senso de sair assim que eu lhe pedisse.

Era revoltante para Armando vê-la se divertir às custas dele, fazendo-o sentir-se ridículo. E pior: defender Nicolás contra suas acusações.

— Ah, é?! Pois eu também teria, se tivesse entrado num quar­to de uma mulher; mas acontece que entrei no quarto de uma menina.

— Não precisa ser agressivo, Armando. Já deve ter percebido que sou uma mulher, caso contrário, o fato de eu estar nua sob o lençol não o teria incomodado.

— Ora, não fale assim comigo! E pare de me provocar!

Satisfeita, ela o viu corar novamente. Nunca o vira enrubescer até então, desde que o conhecia.

— Mas, é verdade, Armando — prosseguiu, ignorando o aviso para que não o provocasse; era exatamente esse o intuito dela. — Estou completamente nua aqui embaixo, sem nenhuma peça de roupa. Quer que eu prove? Assim você verá por si mes­mo que já sou uma mulher. — Então, num gesto provocante, pegou a ponta do lençol e começou a puxá-lo.

Desesperado, Armando correu para perto da cama para segurar-lhe o pulso. Porém, acabou tropeçando no tapete e caiu meio deitado sobre a cama, numa posição comprometedora.

— Comporte-se, Betty, ou nós dois vamos acabar meti­dos em confusão. E se sua mãe...

Suas palavras funcionaram como uma profecia e, horroriza­do. Armando viu Júlia surgir à porta.

— Espero que tenha uma boa explicação para isso também, Armando — Júlia disse, arqueando as sobrancelhas. — Mas deixe-me avisá-lo de que minha paciência tem limite. Primeiro eu o surpreendo com a mão dentro do decote de minha filha; no dia seguinte, vejo-o deitado na cama dela. Que desculpa você vai inventar dessa vez?

A reprimenda o fez sentir-se como um garoto de escola surpreendido ao colar numa prova, mas o nervosismo impedia-o de encontrar uma boa resposta. Sem uma palavra, tentou levantar-se da cama com um mínimo de dignidade, mas o salto da bota enganchou-se na ponta do cobertor e ele quase caiu no­vamente deitado sobre Beatriz.

— Agora não, querido — disse Beatriz, com um sorriso malicioso nos lábios. Era o máximo vê-lo todo encabulado. Logo Armando, que se gabava de ser absolutamente seguro de si e gostava de ridicularizar os amigos. — Tenho que recuperar as forças; você é muito impetuoso, meu bem.

— Beatriz! — gritaram Armando e Júlia em uníssono, pasmos.

— Beatriz! — Júlia adiantou-se. — Está querendo dizer que vocês dois... Que... Meu Deus, eu nunca pensei que...


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quinta-feira, 22 de maio de 2014

Até o seu jeito de falar


Armando franziu a testa ao vê-la falar de Mário com tanto en­tusiasmo. Ela estava mais sexy do que nunca, sentada na ca­ma, com os lençóis enrolados no corpo. Que diabos estava acontecendo com ela? Beatriz nunca fora provocante e se­dutora; no entanto, ultimamente, até o seu jeito de falar era outro.

— Não, não compreendo, certamente não entendo por que essa diferença. Você o conhece tanto quanto a mim. — lndisfarçadamente, Armando a devorava com o olhar. — Você está usando alguma coisa por baixo desse lençol? — perguntou de repente.

Beatriz estava se divertindo um bocado com a atitude ciu­menta dele em relação a Mário. Por outro lado era inegável que Armando começava a vê-la como mulher.

— Não — confessou, abafando o riso. — Não estou de camisola. Mas não podia imaginar que alguém fosse entrar aqui sem bater. Além disso, não sei em que esse fato poderia afetá-lo. Poderia passar nua na sua frente e sei que não aconteceria nada.

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quarta-feira, 21 de maio de 2014

Está adulto, compreende?


Beatriz não permitiu que aquelas palavras frívolas a ma­goassem e resolveu abordar a questão com a mesma displicência:

— Não me lembro de haver me declarado perdidamente apai­xonada por você, Armando. E, se é assim que você pensava, reco­nheço que é muito mais egocêntrico do que eu imaginava. Você tem toda razão: nós nos conhecemos bem demais... E, agora, por que não vai me esperar na cozinha? Se ninguém tiver feito o café, por favor, ponha a água para ferver. Estou louca por um café bem quente.

Armando assentiu, raciocinando sobre o que ela dissera anterior­mente sobre se conhecerem demais. De fato, era assim que pen­sava, mas, vindo dos lábios dela, a ideia não o agradava. Ainda assim havia uma esperança.

— O mesmo acontece com você e Mário, não é? Quero di­zer, você o conhece desde criança e na certa não iria se interes­sar por ele. A não ser como amigo, claro. — E aguardou ansioso pela resposta. Não suportava a ideia de que houvesse algo mais, além de amizade, entre Beatriz e Mário.

Seria impressão dela, ou Armando estava com ciúme? Disfarçan­do seu contentamento, Beatriz sentou-se na cama, sorrindo, e abraçou os joelhos.

— Ah... não sei. Com Mário é diferente. Ele viveu muitos anos longe daqui e mudou muito. Claro que guardo recorda­ções dele como meu amigo de infância, mas acho que exata­mente por este motivo é que nosso reencontro torna-se mais interessante. Mário amadureceu, está adulto, compreende?

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terça-feira, 20 de maio de 2014

Não reparar


A pergunta a desconcertou. Então Armando não sabia mesmo que tudo mudara entre eles?

— Você sabe... como as coisas mudaram entre a gente — disse, sentindo que enrubescia. — E, se quer mesmo falar co­migo, vai ter de esperar lá embaixo até eu me vestir. Aliás, por que não bateu antes de entrar?

Armando procurou não reparar nos movimentos sensuais de Beatriz sob os lençóis.

— Eu bati, mas ninguém respondeu. E desde quando preci­samos dessas formalidades? Sempre entramos, um na casa do outro, sem pedir licença.

— Sem dúvida, mas este é um hábito que vamos ter de per­der. Às vezes, pode-se ouvir conversas bastante desagradáveis — comentou com ironia. — Além disso, se minha mãe entrar aqui e o encontrar, vai ficar furiosa. Afinal, se você é tão arredio ao casamento, é melhor ser mais cuidadoso.

Armando lançou-lhe um sorriso maroto, que o deixava ainda mais charmoso.

— Ora, vamos, Betty. Você sabe tão bem quanto eu que o nosso casamento jamais daria certo. Nós nos conhecemos bem demais.

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segunda-feira, 19 de maio de 2014

Tão agitada quanto a dele


O sol já estava alto quando batidas fortes à porta do quarto a despertaram. Mal abria os olhos quando Armando entrou

— Armando — ela murmurou, afastando os cabelos do rosto. — O que você está fazendo aqui, no meio da noite? Aconteceu al­guma coisa com Roberto?

Armando balançou a cabeça numa negativa, deslumbrado com a beleza de Beatriz: os cabelos revoltos espalhavam-se sobre o travesseiro, os lençóis desarrumados indicando que tivera uma noite tão agitada quanto a dele, os olhos embaçados de sono...

— Que eu saiba, Roberto está mais firme que nunca. E fique sabendo que já é quase meio-dia. Levante-se, preciso falar com você.

Beatriz o amava, mas não suportava tanta arrogância.

— E isso lhe dá o direito de entrar no meu quarto sem bater e me tirar da cama? Quem você pensa que é?

Frustrado, Armando suspirou. Por que Beatriz tinha de ser tão contraditória?

— Sou Armando, seu amigo, e quero falar com você. E não pre­cisa ficar tão exaltada por eu ter entrado aqui; esta não é a pri­meira vez.

— Mas isso foi há muito tempo; as coisas mudaram.

— Mudaram como?


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domingo, 18 de maio de 2014

Bas­tante significativos


Beatriz rolou na cama insone a noite inteira, relembran­do inúmeras vezes os acontecimentos ocorridos na festa. Ape­sar de desagradáveis, o saldo era francamente positivo. O novo visual dela fora um verdadeiro sucesso. Nunca tivera tantos par­ceiros de dança numa só noite, o que a deixava orgulhosa de si mesma. Mas Armando tinha de estragar tudo! Claro que houve momentos em que ele a tratou como mulher. Breves, mas bas­tante significativos. Foi a primeira vez que ele a beijou daquele modo apaixonado e a tocou com tanta... volúpia. Ainda que por poucos segundos, Armando acariciara-lhe os seios... O que teria acontecido se Júlia e Roberto não os tivessem interrompido?

Era uma pena que eles estivessem exercendo tanta pressão so­bre Armando. Sabia que por si só, cedo ou tarde, ele acabaria mu­dando de opinião; a prova era que Armando já começara a mudar de atitude em relação a ela. Era do tipo que não gostava de sei pressionado e, ao se sentir acuado, procurava fugir da situa­ção. Beatriz alimentava esperanças de que tudo acabasse se voltando era seu favor.

Quando poderia imaginar que Armando um dia ia ter ciúmes dos outros rapazes que se aproximavam dela! Até mesmo de Mário, a quem conheciam desde crianças!

Tudo seria muito mais fácil se o homem dos seus sonhos não fosse tão arredio à ideia de se casar, mas nada a faria perdei as esperanças. E, recordando-se pela milésima vez do beijo que haviam trocado, abraçou o travesseiro e fechou os olhos, pe­gando no sono, quando os primeiros raios de sol já se infiltra­vam pela janela do quarto.

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sábado, 17 de maio de 2014

Muito justo


— O que você veio fazer aqui? — Armando indagou ao ver Mário parado à porta.

— Nada, meu velho. Eu já ia para casa, quando achei me­lhor vir lhe dizer que seus últimos convidados adoraram saber o que se passou aqui.

Armando lançou-lhe um olhar inquisitivo, e Mário explicou me­lhor a situação:

— É que alguém que passava por aqui ouviu quando Betty lhe pediu que não... enfiasse mais a mão no decole dela. O que, aliás, me pareceu um pedido muito justo.

— Tem certeza de que não foi você quem andou espalhando fofocas por aí?

— Olhe, por mim já chega — disse Mário, balançando a cabeça. — Tive uma noite bem movimentada e acho que já vou indo. Não sei se agüentaria outra briga como a que tivemos. Quanto a espalhar fofocas... esqueça! Não fui eu quem ouviu o pedido de Betty!

— Eu sou um imbecil!

Mário, imperturbável, abraçou Armando pelos ombros e o consolou:

— Não ligue, isso passa. E, agora, por que não me acompa­nha até o meu hotel. Acho que tenho uma garrafa de uísque na mala e um trago vai lhe fazer bem. Quanto aos convidados, irão embora assim que o virem sair.

Então Mário conduziu Armando para fora do quarto e avisou Roberto:

— Com licença, sim? Mas acho que o amigo aqui já teve emo­ções demais por uma noite. Você se despede do pessoal por ele?

— Tudo bem, podem ir, mas não o deixe beber demais. Ama­nhã, nós dois precisamos ter uma conversinha.

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sexta-feira, 16 de maio de 2014

Magoadíssima


Ao ouvi-lo, Beatriz ficou magoadíssima.

— Não se preocupe, Don Armando Mendoza, pois eu não me ca­saria com você nem que me pedisse de joelhos! — declarou, deixando evidente o quanto a ferira. — Você é grosseiro, mal-humorado e prepotente!

Armando, por sua vez, não suportou tanta humilhação:

— Ah, então é delicadeza que você quer? Isso não vai ser problema enquanto Nicolás Mora estiver por perto, parecen­do um cão farejador.

— Tem toda razão. Há muitos outros rapazes que me acham bonita, atraente e não me tratam como irmã. Eles, pelo me­nos, não são cegos como você, que não enxerga um palmo a frente do nariz! — E, erguendo o queixo, caminhou até a por­ta, — E nunca mais enfie a mão no meu decote!

Já no carro, Júlia sussurrou baixinho para a filha:

— Querida, eu sabia que esse vestido ia fazer sucesso!


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quinta-feira, 15 de maio de 2014

Na hora certa!


— Até que enfim os encontramos — Roberto declarou ao en­trar no quarto, com Júlia.

— E, pelo visto, chegamos na hora certa! — completou Júlia, com os olhos arregalados.

Assustado, Armando deu um passo para trás, mas sua mão enganchou-se no decote do vestido de Beatriz. Encabuladíssima, ela afastou-se logo.

Roberto por sua vez, caminhou em direção ao filho, com um sorriso de satisfação, e deu-lhe um tapinha nas costas.

— Eu sabia que vocês iam se entender. Foram feitos um pa­ra o outro. Quando vai ser o grande dia?

Júlia deu um beijo carinhoso na filha e, depois, em Armando.

— Puxa, há tantas coisas para planejarmos antes do casa­mento! — E voltou-se para Roberto: — E acho melhor andarmos logo; o rapaz parece estar meio impaciente.

Beatriz, confusa, não sabia o que fazer.

Vendo a expressão dos dois, Roberto sorriu.

— Júlia, acho que eles ainda não planejaram nada. Você tinha coisas mais urgentes em mente, não é, filho?

— Ei, espere aí! — Armando protestou, irritado com a brincadei­ra — Vocês dois estão enganados; não estávamos fazendo nada.

— Não foi a impressão que tive.

— Era apenas um beijo. Há alguma lei que proíba o beijo neste Estado?

— Ah, então quer dizer que era só um beijo?! — Júlia per­guntou, erguendo as sobrancelhas. — Por acaso não vi sua mão dentro do decote de minha filha? No meu tempo, isso era muito mais do que um beijo. Aliás, quando meu pai me surpreendeu com... Bem, não importa, estamos discutindo o namoro de vocês.

— Nós não estamos namorando — Beatriz adiantou-se.

O comentário, no entanto, foi ignorado:

— E já que minha filha não tem pai, farei as vezes dele — Júlia prosseguiu.

Diante de tamanho absurdo, Beatriz teve um ataque de riso.

— Não se preocupe com isso, Júlia querida — disse Roberto — Terei muito prazer em fazer as vezes do pai de Beatriz, pois a quero como filha.

— Mas você é meu pai! — Armando protestou. — E vamos aca­bar logo com essa conversa: não houve nada entre nós. Apenas um beijo.

— Pois eu discordo — ponderou Roberto — A mim parecia que você havia finalmente caído em si e resolvido casar-se com Betty.

— Tudo não passou de um mal-entendido. Eu já disse que ainda não estou preparado para o casamento e não vou admi­tir que você me force a nada só por causa de um beijo!

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Foram suficien­tes


O tom rouco, o brilho intenso de seus olhos foram suficien­tes para fazê-lo perder o autocontrole. Sem refletir, Armando fez o que vinha querendo fazer desde que a vira chegar na festa: curvando-se, aproximou os lábios dos dela e a beijou.

Beatriz, trêmula, fechou os olhos e entregou-se àquele pra­zer. Armando beijava-a com calma, provocando-a, acariciando-lhe os lábios com a ponta da língua, sem pressa. Temendo que os joelhos fraquejassem, ela foi obrigada a lançar-lhe os braços em torno do pescoço. Parecia viver um sonho...

A reação dela excitou Armando, e ele, que a princípio pensara ape­nas em beijá-la, deslizou-lhe as mãos pelas costas, puxando-a de encontro a si. Insinuou os dedos sob o tecido do vestido e tocou-lhe a pele alva dos ombros. Jamais imaginara que fosse tão suave, tão acetinada... À medida que o beijo se aprofunda­va, os dedos desciam mais e mais em direção aos seios.


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terça-feira, 13 de maio de 2014

Sobre o tecido do vestido


Então, quando os dedos dele começaram a descrever peque­nos círculos em sua pele, Beatriz concluiu que melhor ainda seria não demonstrar sua raiva de maneira nenhuma,

Porém, o orgulho levou-a a aprumar os ombros e esquivar-se daquelas carícias.

— Se eu soubesse do que você está falando, talvez pudesse ajudá-lo.

Aquela atitude o magoou e, ignorando-a, Armando tornou a tocá-la da mesma forma.

— Não me venha com indiretas e rodeios, não fica bem pa­ra uma garota tão delicada como você.

— Ah, quer dizer que não estou me portando como uma da­ma, não é? E como você queria que eu me portasse quando con­tinuo a ser tratada como uma menina?

Essa nova tática de Armando — olhares dóceis, maneiras gentis, carícias — a desconcertava, e Beatriz ficou sem ação quan­do sentiu-lhe as mãos deslizarem por sobre o tecido do vestido. Arrepiada, procurou concentrar-se no que falava, e não no que ele fazia, sem tentar esquivar-se, já que a primeira tentativa não fora bem-sucedida.

Envolvido pela beleza dela, Armando, inconscientemente, man­teve uma das mãos onde estava, enquanto com a outra acariciava-lhe o rosto aveludado.

— Desculpe-me Betty. Você é uma dama. E, embora eu sinta falta daqueles nossos tempos de infância, admito que se transformou numa mulher muito, muito bonita.

Beatriz ficou pasma. Armando jamais lhe falara daquela for­ma, como se realmente a levasse a sério. Poucos centímetros os separavam, e o hálito morno dele lhe tocava o rosto.

— É mesmo? — perguntou, vacilante, umedecendo os lábios com a ponta da língua. — Você me acha bonita?


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segunda-feira, 12 de maio de 2014

De outra forma


Sem voltar-se ela o fitou pelo espelho. O modo como Armando a olhava fazia disparar-lhe o coração. Nunca vira aquele bri­lho em seus olhos. Por um momento, chegou a pensar que ele estava de fato atraído por ela; não como amigo de infância mas como um homem!

Porém, balançando a cabeça, descartou a ideia, estava farta de ouvi-lo dizer que a considerava uma irmã, que não a queria como namorada, que não estava disposto a se casar.

— Você estava me procurando?

Armando pigarreou, tentando ganhar tempo para organizar os pen­samentos. Por que era tão difícil conversar com ela, se eram amigos há tantos anos?

— Sim — gaguejou, vendo-a pentear os cabelos e fingindo ignorá-lo.

Por fim, seu temperamento impaciente falou mais alto. Co­mo Beatriz ousava ignorá-lo? Nervoso, cobriu a distância que os separava a passos largos e, segurando-a pelos om­bros, obrigou-a a encará-lo.

— Diabos, Betty, você não está facilitando em nada as coi­sas para mim!

Beatriz ergueu o rosto e o fitou, já prestes a tirar-lhe as mãos dos ombros, no entanto o calor reconfortante daquele to­que a fez mudar de ideia. Seria melhor mostrar sua indignação de outra forma.

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domingo, 11 de maio de 2014

Beatriz em frente ao espelho

Armando mal acreditou no que ouvira. Achara que conseguiria envergonhá-lo perante todos ali, mas Nicolás tinha seus trunfos.

— Como você explica isso, Beatriz?

— Não me olhe assim, não tenho culpa de nada — ela se de­fendeu, odiando Nicolás. — Pergunte à minha mãe, se quiser. As terras são dela.

Farta de tudo aquilo, Beatriz virou-lhes as costas e afastou-se. Nicolás desculpou-se e a seguiu. Armando, inconformado com tudo aquilo, praguejou e fez com que Mário se levantasse.

— Ei, se está pretendendo me esmurrar de novo, peço tem­po para me prevenir.

— Ora, não se faça de vítima. Você sabe perfeitamente que poderia acabar comigo se quisesse.

— É verdade, mas não seria gentil de minha parte provocar um escândalo na sua festa.

— Você nunca se prendeu por causa dessas bobagens — res­pondeu Armando, desejando poder odiá-lo. Mas era impossível.

— Isso é porque você não estava numa situação delicada, Armando.

— O que você quer dizer com isso?

— Descubra sozinho. Quanto a mim, acho que vou para o bar beber um pouquinho mais. Se eu fosse você, faria o mesmo.


Mário, porém, teve de arranjar outra companhia, pois ao entrar Armando viu Beatriz subir a escada com ares de quem ia apanhar suas coisas e se despedir. Sem pensar duas vezes, ele a seguiu, subindo os degraus de dois em dois, quando a viu en­trar no dormitório onde estavam guardadas as bolsas. Ao abrir a porta, deu com Beatriz em frente ao espelho, refazendo o penteado.


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sábado, 10 de maio de 2014

É uma pena que pense assim


Beatriz preferia que o incidente tivesse ficado só entre os três, mas uma roda de convidados já os cercava, atraída pela briga, e ela achou melhor aceitar a oferta de Nicolás.

Tendo-a já de pé a seu lado, Nicolás voltou-se para Armando, com um sorriso:

— Sinto muito pelo incidente, sr. Mendoza, mas tenho cer­teza de que não haverá maiores conseqüências. Beatriz tam­bém sente pelo ocorrido. Se possível, gostaria de encontrá-lo durante a semana para tratarmos de negócios; tenho uma pro­posta a lhe fazer!

Os três amigos assistiam à cena boquiabertos. Beatriz, po­rém, quebrou o silêncio:

— Não preciso que você se desculpe por mim, Nicolás Mora, pois, se fosse o caso, eu mesma o teria feito.

Nicolás deu-lhe uns tapinhas carinhosos na mão que ela man­tinha em seu braço e disse:

— Ora, meu bem, você está muito abalada. Não seja volun­tariosa.

— Betty não é voluntariosa — Armando interrompeu, revolta­do com a atitude autoritária de Nicolás. — E sabe perfeitamente falar por si só.

Sua vontade era tirá-la dos braços daquele almofadinha pe­tulante, mas temia a reação que o gesto poderia causar. Não por parte de Nicolás, mas de Beatriz. Então, resolveu apelar para um discurso bem claro:

— E quanto aos negócios, esqueça. Não pretendo em hipó­tese nenhuma vender a fazenda, não há por que perdermos tempo.

— É uma pena que pense assim, sr. Mendoza, mas estou certo de que encontrarei outra propriedade. A de Júlia, por exemplo.


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sexta-feira, 9 de maio de 2014

Enquanto me recupero?


— Betty, querida, ele me deu um murro e tanto. Posso apoiar minha cabeça no seu colo enquanto me recupero?

— Seu fingido! — Armando exclamou, vendo-a segurar-lhe a ca­beça com ternura. — Você sabe muito bem que nem empreguei toda a minha força. Agora, veja se levanta e age como homem!

— Ora, seu... bárbaro! Por acaso ele seria mais homem se ficasse de pé e o deixasse esmurrá-lo de novo?

— Mas, Betty, será que você não percebe que é fingimen­to? Além disso, não sei por que ficou tão brava comigo; eu só estava tentando protegê-la.

— Tentando me proteger? — ela repetiu, sem crer no que ouvia. E, sobretudo nas atitudes de Armando: ele parecia ter perdi­do o juízo. — É assim que você queria me proteger? Pois eu estava muito bem, até que você chegou. Agradeço e dispenso seus cuidados. Você nunca foi disso; por que essa bobagem, agora?

Embevecido com tanta beleza, Armando a fitava maravilhado com o pensamento distante.

— Eu lhe fiz uma pergunta.

— Bem, é que... droga, eu sempre me importei com você. Só que agora o inimigo é outro.

E lançou um olhar letal para o amigo, que assistia a tudo imó­vel no chão.

— Não existe inimigo nenhum, seu boboca! — ela alegou, um pouco mais calma. A sinceridade dele a desconcertara; era bom saber que Armando se julgava responsável por sua segurança.
— Mário é nosso amigo, e me admira que você faça mal juí­zo dele. Fique sabendo que não preciso de ninguém para me proteger! Não sou mais garota, sou mulher!

Mas, antes que Armando pudesse responder, Nicolás chegou ao terraço e os interrompeu.

— Beatriz, meu bem, o que houve? Deixe-me ajudá-la.


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quinta-feira, 8 de maio de 2014

Tão be­la e tão furiosa


Ao ouvi-la pronunciar seu nome, a raiva se dissipou. Ali de pé, Armando olhou-a ajoelhada e concluiu que nunca a vira tão be­la e tão furiosa. A saia subira, deixando à mostra as longas per­nas bem torneadas, envoltas em meias de seda. Os cabelos se desprenderam do coque, caindo-lhe pelos ombros muito alvos, e os olhos estavam brilhantes de ódio.

— Betty... eu... — E ofereceu a mão para ajudá-la a se levantar. Beatriz, no entanto, afastou-a com um gesto violento.

— Não me toque, Don Armando Mendoza! — preveniu enuncian­do pausadamente cada sílaba da frase. — Você já passou do limite. Acho que, por hoje, chega!

Olhando para o amigo caído, apoiado num cotovelo, ela per­guntou, com carinho:

— Mário, você está bem? Esse brutamontes não o machu­cou? — E passou um braço pelas costas dele. — Venha, deixe-me ver.

— Você está maluca! — Armando gritou, inconformado, vendo-a acariciar o rosto de Mário. — Como pode me chamar de brutamontes, quando ele é mais alto e mais pesado do que eu?

— É o temperamento, e não o tamanho, que está em ques­tão — ela explicou, num tom gélido. — Mário, deixe-me ver se você está machucado.

Mário gemeu, manhoso.


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quarta-feira, 7 de maio de 2014

Sequer pro­testava!


E, segurando-a pela cintura com ambas as mãos, ergueu-a do chão até que ficasse da sua altura e a beijou nos lábios com paixão. Em seguida, colocou-a sentada sobre a mureta e a bei­jou novamente.

Armando cruzou as portas do terraço e, agitadíssimo, olhou pri­meiro para a direita e, então, para a esquerda. Seu autocontrole estava por um fio; sabia que não deveria ter confiado em Mário. O rapaz transformara-se num conquistador barato e estava visivelmente atraído por Beatriz. Sua esperança era que o amigo tivesse um mínimo de decência e não...

A uma simples visão do casal num canto do terraço, suas es­peranças caíram por terra. Furioso, observou melhor a cena. Mário a beijava apaixonadamente, e Beatriz sequer pro­testava! O ódio o cegava e o impedia de raciocinar direito. Ti­nha de fazer algo para pôr um fim àquilo. Mário e sua Betty! Que imoralidade!

Sem refletir, cobriu a distância que o separava do casal e, tocando o ombro de Mário, esperou que este se virasse para, então, desferir-lhe um soco violento. O rapaz cambaleou, der­rubou uma mesinha e caiu no chão, atordoado.

Antes mesmo de golpeá-lo, Armando ouviu Beatriz gritar apa­vorada e, segundos depois, via-a ajoelhar-se ao lado do amigo.

— Don Armando Mendoza! — ela gritou. — Você ficou maluco?

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terça-feira, 6 de maio de 2014

Vou lhe provar a fama que tenho


Para a própria surpresa, Beatriz estava se divertindo mui­to na festa. Apesar de a principio não ter desejado ir e de Armando ter feito de tudo para aborrecê-la, agradava-lhe saber que fazia sucesso entre os rapazes e que a cada dança tinha um novo par­ceiro. E, ao contrário do que Armando insinuara, todos a tratavam com o máximo respeito.

A festa estava na verdade ótima pelo fato de nem por um segundo sequer Armando deixar de observá-la, a distância, com ares de censura. Só para provocá-lo, tinha prazer em rir bem alto nos braços de seus parceiros, deixando evidente que suas ofen­sas não a haviam aborrecido nem um pouco.

Beatriz já havia perdido a conta de quantas músicas dan­çara, quando, ao final de mais uma, encontrou Mário aguardando-a para a próxima.

— Ah... — comentou, radiante. — Que bom, é você.

— Ah... — ele repetiu, divertindo-se. — Finalmente você me viu, não é? Aliás, de todos com quem você já dançou, reco­nheça que sou o mais bonito, o mais gentil.

A companhia agradável de Mário a fazia rir com incrível facilidade.

— Ora, seu convencido! Espero que não se incomode com esta pausa, mas estou exausta e fiquei sem jeito de pedir um descanso para os outros rapazes.

— Por mim, tudo bem. Aliás, é até um alívio, pois acho que Armando não hesitaria em me quebrar a cara se nos visse dançando.

— Exagerado! Vamos tomar um drinque lá fora?

Já havia diversos outros casais no terraço, desfrutando da brisa agradável que soprava. A lua cheia lançava seus raios azu­lados sobre as encostas das montanhas, formando sombras misteriosas sobre os vales. Era uma noite ótima para namorar, mas Beatriz dava-se por feliz com a companhia alegre de Mário.

— E então? O que você tem feito ultimamente, Mário? — ela quis saber ao se recostarem contra a mureta de pedra que cercava o terraço. — Há tempos que não o vejo por aqui.

Mário fez uma pausa antes de responder e lançou-lhe um olhar sério.

— Tempo demais, Betty, querida. Muita coisa aconteceu durante a minha ausência. Você, por exemplo, transformou-se numa linda mulher.

— Você também mudou, Mário — disse Beatriz, tocando-lhe a barba com carinho. — Por que deixou a barba crescer?

Brincalhão, Mário tirou-lhe a mão do rosto.

— Mais respeito, garota. Não sei se sabe, mas hoje em dia sou considerado um bom partido.

— Imagine só! — exclamou, revirando os olhos.

— Ah, você não acredita? Já vou lhe provar a fama que tenho.


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segunda-feira, 5 de maio de 2014

Talvez você vá interromper


Roberto coçou a cabeça, observou o filho e comentou:

— Sabe de uma coisa? Não consigo entendê-lo. Não quer namorá-la, mas avança como cachorro bravo em qualquer um que se aproxime de Betty. Por acaso, não gostaria de rever seu ponto de vista sobre o casamento?

— Claro que não — garantiu, balançando a cabeça numa demonstração de desgosto. — Já disse e repito: não penso em me casar com ninguém no momento. E, mesmo que pensasse, Beatriz não seria a garota ideal.

— E, por acaso, já conhece a garota ideal? Por que não a traz aqui para eu conhecê-la? Só lhe dou um conselho: antes de pedi-la em casamento, certifique-se de que a moça é do tipo que gosta da vida no campo. Moramos um pouco afastados da cidade grande,

— Eu não disse que já tinha alguém em vista. Só disse que não estou a fim de me casar. E, mesmo que estivesse, ela não seria minha primeira escolha. Eu e Betty somos como irmãos.

— É melhor não deixá-la ouvi-lo falar isso de novo!

— Que droga, Roberto Quer, por favor, mudar de assunto? Já disse que não estou pensando em me casar. E, agora, se não tiver mais nada para me dizer, acho que vou respirar um pouco de ar fresco.

Só que Roberto tornou a detê-lo.

— Eu não faria isso, se fosse você. A menos que queira se sentir um intruso.

— Roberto quer se explicar?

Roberto simplesmente apontou em direção à porta do outro la­do da sala.

— Talvez você vá interromper alguma coisa.

— Como assim?

— Bem, é que Mário acaba de levá-la lá fora. Betty pro­vavelmente está cansada e quis espairecer um pouco. Vi quan­do Mário apanhou um drinque, antes de saírem.

Antes que Roberto completasse seu pensamento, Armando já havia cruzado a sala, furioso. Satisfeito, Roberto deu uma gargalhada, que chegou aos ouvidos do filho.

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domingo, 4 de maio de 2014

Não até aquela noite


Armando olhou espantado para o pai.

— Não tenho negócio nenhum a tratar com esse almofadi­nha da cidade grande!

— Ouvi dizer que ele quer comprar nossa propriedade.

— Ele não tem jeito de fazendeiro. Com certeza já falou que nossa fazenda não está a venda, não é?

— Sim, para ser franco, falei, mas mesmo assim ele quer con­versar com você. Pelo visto, pensa que, por ser mais jovem, talvez você seja mais aberto a sugestões. Mas num ponto você tem razão: ele não entende nada de fazendas!

— Então o que ele quer com a propriedade?

— Quer transformá-la numa estação de esqui supermoderna.

— Jamais! — Armando explodiu, atraindo a atenção de vários convidados mais próximos.

— Calma, rapaz — disse Roberto batendo-lhe de leve no om­bro. — Não queira fazer escândalo; você só precisa chegar e dizer não. O rapaz ainda vai ficar esta semana na casa de Júlia, e é melhor você ir vê-lo qualquer dia. Aqui não é lugar para discutir negócios.

— Ainda assim a ideia não me agrada. Se eu soubesse disso, teria destruído os planos dele logo que nos conhecemos, em Cartagena. — E franziu as sobrancelhas. — E, se eu soubesse que ele ia ficar dando em cima de Betty desse jeito, teria feito de tu­do para que não aceitasse o convite de Júlia. Esse tipo de coi­sa só pode prejudicar a reputação da garota.

Roberto deu de ombros:

— Não sei, não. Júlia me contou que Betty ouviu nossa conversa aquele dia, quando sugeri que vocês se casassem, e fi­cou muito magoada. Aliás, eu a entendo; você foi um bocado indelicado. Acho que ela faz muito bem em flertar com aquele moço; pelo menos ele sabe lhe dar valor.

A expressão de Armando tornou-se ainda mais sombria.

— Não seja ridículo. Betty não é do tipo que se deixa se­duzir por um monte de baboseiras. — Armando fazia força para acre­ditar no que dizia, porém era difícil. Noutros tempos, teria sido mais fácil, mas, agora, vendo-a rir e divertir-se nos braços de Nicolás, não havia argumento que o convencesse. — E não pense que fui só eu que a magoei, pois você falou umas coisas bem pouco lisonjeiras a respeito dela.

Roberto reconheceu que o filho tinha certa razão e coçou o queixo.

— Vou me desculpar pessoalmente na próxima vez que a vir. Mas o que mais me magoa é que todo esse mal-entendido a in­dispôs contra nós e, segundo Júlia, Betty está pensando seriamente em voltar para Cartagena com esse... almofadinha.

A novidade atingiu Armando em cheio.

— Mas ela nem o conhece direito! Não, eu não acredito. Betty não faria isso.

Pelo menos, esperava que não. E o que Roberto queria dizer com "a indispôs contra nós"? Ele e Beatriz podiam ter suas di­vergências de opinião, mas nunca chegaram a discutir ou bri­gar. Pelo menos, não até aquela noite.

— Não é bem assim; o rapaz é filho de uma amiga de Júlia. Ele e Beatriz se conhecem desde crianças.

— Pois eu e ela também nos conhecemos há anos.

— E daí? — Roberto indagou, torcendo o bigode.

— E daí que não vou permitir que ninguém a importune.

E com isso fez menção de seguir em direção à pista, onde Beatriz dançava com Nicolás.

Roberto o deteve:

— Vá com calma, meu filho. A música terminou, mas a pró­xima é de Mário. Com ele, Betty estará em boas mãos. Afi­nal, são velhos amigos.

— Não sei, não — Armando murmurou, mal-humorado, olhan­do com malícia para o amigo.


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sábado, 3 de maio de 2014

Nos braços de Nicolás


Pela primeira vez desde que a festa começara, Armando deu uma sonora gargalhada.

— Nem me fale. Você, Betty e eu — comentou, observando-a sorrir e rodopiar nos braços de Nicolás. — Por que tudo teve de terminar?

— Porque já era tempo — Mário ponderou, dando-lhe um tapinha no ombro. — Nós nos tornamos adultos, Armando.

Tomando mais um gole da bebida, Armando olhou para Beatriz e suspirou.

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Roberto juntou-se a Armando, no bar, onde este passara a maior parte da noite, recostado no balcão. Ambos observavam Beatriz rir e dançar, aproveitando a festa ao máximo.

— Beatriz parece estar se divertindo; já não se pode dizer o mesmo de você. As pessoas já estão começando a ir embora, e você só dançou uma três vezes.

— Graças a Deus os convidados já estão indo — Armando murmurou.

Nunca se sentira tão infeliz numa festa. Muito menos na sua festa.

— O que foi que disse?

— Disse que isso é ótimo — respondeu, mal-humorado, já prevendo um sermão por parte do pai.

— O que está acontecendo com você, meu filho? Você sempre gostou de festas — Roberto observou, com um brilho diverti­do no olhar. — Não está se sentindo bem? Parece que tem algo atravessado na garganta.

Armando lançou-lhe um olhar que faria qualquer outro gelar, porém Roberto caiu na gargalhada:

— Ora, eu só perguntei.

— Sim, eu sei. — Ambos permaneceram em silêncio, saboreando seus drinques, enquanto observavam os casais dançando. — Ela está dançando com ele de novo.

— Quem está dançando com quem? — Roberto perguntou, fazendo-se de inocente, só para provocá-lo.

— Ouça aqui, Roberto não estou para brincadeiras; você sabe muito bem de quem estou falando. Beatriz está dançando de novo com aquele... sujeitinho que Júlia convidou. Às vezes acho que ela não raciocina direito.

— Só de vez em quando, filho, mas não admito que lhe falte com o respeito. Júlia tem seus defeitos, mas é uma dama. Além disso, qual o problema de ter convidado aquele rapaz para vir se hospedar na fazenda delas? É filho de uma amiga antiga e está procurando uma propriedade para comprar nesta região. Aliás, ele me disse que quer falar de negócios com você.

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sexta-feira, 2 de maio de 2014

Já parou para pensar


Armando e Mário, absolutamente pasmos, assistiram à cena sem um comentário. Segundos depois, passado o choque inicial, Mário voltou-se para o amigo:

— O que me diz dessa?

— Nada! Minha vontade é ir lá e acabar com aquele sujeitinho!

— Tenho certeza de que sim, mas seja razoável: a ocasião não é das melhores. Além de estragar os móveis e o smoking, acabaria com a festa. Por que não me deixa pagar-lhe um drin­que? Estou certo de que um bom uísque irlandês cairia bem.

— Nós não temos uísque irlandês e também não cobramos pelas bebidas! — Armando murmurou, enquanto rumavam para o bar disposto perto da porta da cozinha.

Mário respirou fundo, fingindo-se contrariado:

— Bem, neste caso, acho que um escocês serve.

Já servidos, recostaram-se contra o balcão e observaram os casais dançando. Armando logo pousou o olhar na figura delicada de Beatriz sendo guiada por Nicolás. Inconformado, suspi­rou e tomou um gole da bebida.

— Ela está crescendo, Mário — admitiu.

— Já cresceu, meu caro. Betty já é uma mulher adulta.

O humor de Armando começava a melhorar, mas logo se lembrou do motivo da briga que tivera com o amigo.

— Por falar nisso, você não chegou a explicar por que a bei­jou daquele jeito. Ainda estou me controlando para não lhe que­brar a cara.

— Como queira — Mário provocou, num tom amistoso, parecendo divertir-se com a situação. — Eu não cheguei a ex­plicar porque ninguém me pediu explicação.

— Pois estou pedindo agora.

— Bem, para ser franco, estava cumprimentando uma ve­lha amiga, a quem não via há muito tempo, e confesso que me diverti um bocado. Nossa Betty transformou-se numa linda mulher.

— Não fale assim dela! — Armando avisou, esvaziando o copo num só gole, enquanto pedia ao garçom mais uma dose.

— Não seja idiota, meu caro, eu não a forcei a nada. Está­vamos nos divertindo bastante, até que você veio nos inter­romper.

— Não me provoque, Mário; já estou bastante nervoso!

— É, já percebi. E me lembre de lhe mandar uma garrafa de um uísque que preste, isto aqui é uma droga. Mas, diga-me: por acaso já parou para pensar por que o fato de eu tê-la beija­do o desagradou tanto?

Armando tomou mais um trago.

— Ela é como uma irmã para mim, e não gosto de ver nin­guém se aproveitando de Betty.

Mário ergueu uma sobrancelha, e seus olhos azuis brilha­ram, divertidos.

— Como uma irmã, é?

— Sim, como irmã! — respondeu Armando, irritado. Então, caiu em si e pediu: — Ora, Mário, não me obrigue a discutir com você. — Armando não estava disposto a conversar com ninguém so­bre seus sentimentos em relação a Beatriz. — Você parece outro homem, sabia?

Percebendo a mudança de assunto, Mário sorriu:

— Como já disse, as garotas parece que gostam do sotaque e da barba. Ah, Armando, meu velho! Lembra-se de nossos tempos de escola?


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quinta-feira, 1 de maio de 2014

Entre Armando e Beatriz


Beatriz ergueu o rosto e reparou naqueles lindos olhos azuis cintilantes.

— Mário Calderón! Não acredito! É você mesmo?

Às gargalhadas, Beatriz puxou-lhe a barba castanha.

— Em carne e osso, Betty, querida. E, agora, que tal um outro beijinho para o seu companheiro de pescaria?

E, sem esperar pela permissão, beijou-lhe os lábios.

Não foi um beijo de amor, tampouco foi fraternal, e Beatriz corou violentamente. Mário sempre fora arrojado, mas nunca a esse ponto. No entanto, apesar de surpresa, não ficou chateada. Afinal, era bom saber que conquistara a admiração de pelo menos um colega de infância. Mário certamente não a via mais como uma menina!

Porém, antes que pudesse desvencilhar-se do abraço, a mão de alguém pousou-lhe no ombro, puxando-a.

— O que está acontecendo aqui? — Armando quis saber, enca­rando o melhor amigo.

Beatriz puxou-lhe a manga do paletó.

— Armando, é Mário. Ele deixou a barba crescer.

— Sei perfeitamente quem é — Armando respondeu. — Só não sei por que Mário estava te maltratando.

Beatriz nunca o vira tão furioso e chegou a temer pela sorte de Mário.

— Armando, ele não estava me mal...

— Fique fora disso, Betty. Este é um caso entre mim e ele.

Mário, inabalável, sorriu para a amiga:

— Ele tem razão, garota. Há anos que eu e Armando estamos nesta disputa, e acho que ainda não conseguimos chegar a um acordo. Só que no momento não estou a fim de estragar meu terno novo. Também não me parece justo esmurrá-lo em plena festa de aniversário.

— Ah! Sempre bancando o engraçadinho, não é, irlandês? E que novidade é essa de falar com sotaque? Você nunca foi disso.

Mário deu de ombros:

— Acabo de voltar de uma visita à Irlanda. Meus pais pas­sam a metade do ano por lá, agora, e acho que peguei o sota­que de novo. — E piscou para Beatriz: — Além disso, parece que as garotas gostam.

Armando estava prestes a perder o controle e puxou Beatriz para trás de si.

— Não tente aplicar nenhum de seus truques com ela, eu ju­ro que vai se arrepender!

— Claro, claro! Mas lembre-se de que não quero estragar meu terno.

Armando começou a se sentir ridículo: como alguém podia que­rer brigar com um sujeito tão simpático como Mário?

— Betty, querida — disse Mário. — Se nosso amigo brutalhão quebrar a minha cara, você promete que me põe no seu colo e me faz um curativo?

Agora já era demais; aquilo era pura provocação!

— Olhe aqui, Mário, estou lhe avisando...

— Vocês dois querem, por favor, se comportar... — disse ela.

Naquele instante, Nicolás os interrompeu:

— Desculpe-me, cavalheiros, mas ainda não tive oportuni­dade de dançar com minha acompanhante. Com licença, sim?

E, pondo-se entre Armando e Beatriz, conduziu-a gentilmente pelo braço até o centro da sala.


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